quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Segredos que não se escondem - escritor Pedro Emanuel Figueiredo


imagem Catarina Rodrigues - Polvo Amarelo

Rodrigo é um rapaz de dez anos de idade que vive em Vila do Conde, uma cidade que se situa no Norte de Portugal. Banhada pelo Oceano Atlântico, esta antiga cidade onde o rio Ave desagua possui importantes monumentos e uma magnífica praia de areia clara e fina, com alguns imponentes rochedos.
Mesmo em frente ao mar existe uma pequena casa branca acinzentada; esta cor acinzentada deve-se ao desgaste da pintura das paredes provocada pela erosão ao longo do tempo. É nessa pequena casa que vive o Rodrigo, um rapaz de estatura mediana, pele morena, olhos verdes e cabelo escuro encaracolado. A cor dos seus olhos confunde-se com o mar em dias de sol e, o seu cabelo parece as suas ondas em dia de tempestade.
Mas, nessa pequena casa em frente ao mar não vive só o Rodrigo, lá vivem também o seu pai, um homem alto, entroncado, com os músculos bem visíveis, moreno e cujas rugas denunciam uma longa vida de trabalho no mar. É que o pai deste pequeno rapaz é pescador de profissão. A sua mãe não tem profissão, ou melhor, é “Dona de casa”, faz um pouco de tudo, além disso também gosta muito de bordar e dedica-se quando pode às rendas de bilros (típico da região).
Rodrigo é um grande admirador da natureza, principalmente do mar, até inventou um pequeno poema dedicado ao mar imponente, que é assim:
Ó mar imponente
Que importante que tu és
Alimentas muita gente
E o que recebes? Pontapés!
Pontapés! Quero eu dizer
Muito lixo, poluição
Como eu gostaria de descrever
O que me vai no coração
Um dia, quando eu mandar
Vou pedir à população
Ajudem-me a limpar
Esta tamanha confusão.

Nutre também uma grande admiração pelo seu pai e pela sua profissão. Rodrigo gostava de um dia também se tornar pescador, mas de peixes das profundezas.
Um dia, enquanto o seu pai arranjava as redes de pesca, Rodrigo confidenciou-lhe que gostava de viajar pelo fundo do mar.
- Mas porquê pelo fundo do mar? – perguntou-lhe seu pai.
- Gostava de ver com que cores o fundo do mar está pintado. – disse Rodrigo.
- De muitas cores. – disse o pai.
- Sabes pai! Ontem o meu amigo Rui disse-me que abriu cá em Vila do Conde uma escola de mergulho, naquela casa amarela que esteve muito tempo em obras, junto ao Castelo.
- Ah! Já sei. E tu gostavas de praticar esse desporto? – perguntou o pai.
 - Adoooooorava. – respondeu, cheio de energia.
- Não sei se na tua idade é permitido o mergulho. – disse o pai.
Rodrigo franziu os olhos e não falou mais no assunto.
Na semana seguinte no dia 20 de Maio Rodrigo fazia 11 anos e, como todas as crianças da sua idade, andava entusiasmado, afinal só se festeja o aniversário uma vez por ano.
- Bom dia filho. – disse o pai. – Parabéns. Hoje é um grande dia e, eu e a tua mãe temos uma prenda surpresa para ti, mas não está cá em casa. Temos de sair.
- O que é? O que é? – perguntou cheio de alegria e curiosidade.
- Surpresa. Levanta-te e depois verás. – continuou o pai.
Rodrigo levantou-se num ápice, lavou-se, vestiu-se e pouco tempo depois estava à mesa pronto para tomar o pequeno-almoço. Bebeu um copo de leite, comeu um pão com marmelada e uma pêra. Depois, calçou as suas sapatilhas novas e foi ter com os pais à sala.
- Estou pronto. – disse. – Já podemos sair.
E saíram os três em direcção ao Castelo, que se situa junto à foz do rio Ave. Pararam mesmo em frente a uma grande casa de cor amarela, grandes portas e janelas e, com persianas brancas bem polidas. Virada para a rua havia uma grande montra onde se encontravam expostos diversos artigos de desportos marítimos como pranchas, fatos, óculos, barbatanas, …
- Entra. – disse o pai de Rodrigo. – O teu presente está aqui.
Os olhos de Rodrigo brilharam tanto, quase tanto como o Sol. Nem podia acreditar. Os seus pais ofereceram-lhe um equipamento e inscreveram-no nas aulas de mergulho.
- Que bom, já vou poder ver com que cores está pintado o fundo do mar. – disse com uma pequena lágrima no canto do olho, devido à imensa emoção.
Rodrigo marcou a sua primeira aula para o dia seguinte. Levantou-se cedo, mesmo antes do despertador tocar, arranjou-se, tomou o pequeno-almoço e foi para a escola. No final das aulas correu para casa em busca do seu equipamento e dirigiu-se para a escola de mergulho.
- Que desilusão! Pensei que já ia mergulhar hoje. – disse Rodrigo.
- Nem pensar Rodrigo, antes de mergulhar tens que assistir a algumas aulas teóricas. – respondeu o professor.
E assim, durante quinze dias o pequeno rapaz assistiu diariamente às aulas teóricas. Aprendeu que é importante respeitar o mar, assuntos relacionados com a fauna e a flora do fundo do mar, o equipamento a usar, procedimentos e cuidados a ter durante o mergulho.
- Estas aulas foram muito interessantes. – disse Rodrigo. – Aprendi imenso.
Até que chegou o dia mais esperado, o dia em que Rodrigo ia dar o seu primeiro mergulho. Eram oito horas e quarenta e cinco minutos e já Rodrigo se encontrava com o seu equipamento de mergulho na praia em frente ao Castelo de Vila do Conde. Poucos minutos depois chegou o seu professor.
- Já cá estás? Madrugaste! – disse o professor.
- Queria estar cá antes das nove horas, para verificar se tenho tudo em ordem.
E assim, professor e aluno fizeram uma revisão dos assuntos, verificaram o material, equiparam-se e mergulharam no imenso Oceano Atlântico.
A aula correu bem, como previsto. Rodrigo sempre apresentou um fascínio pelo mar, mas agora o seu fascínio aumentara ainda mais. E todos os dias, durante meses,  Rodrigo tinha aulas de mergulho teóricas ou práticas, com o seu professor Gaspar.
Até que um dia, resolveu mergulhar sozinho. Vestiu o seu fato de mergulho e deslocou-se para o local habitual. Fez uma revisão dos assuntos importantes e também do material a usar e, mergulhou. Rodrigo não quis afastar-se muito da costa, afinal era o seu primeiro mergulho sem a presença do professor. Nadou, nadou, nadou, ora junto à areia, ora junto às rochas, até que ouviu uma suave melodia sair de uma pequena gruta existente nas rochas. Parou, depois nadou na direcção do som, e parou surpreendido. Nem queria acreditar no que estava a ver. Dentro de uma das pequenas grutas encontravam-se vários polvos a tocar e a dançar, com umas saias multicolores, feitas de algas.
Assim que os pequenos polvos se aperceberam da presença do rapaz a música parou e todos fugiram para pequenos buracos existentes no interior da gruta.
- Não fujam. – disse Rodrigo. – Eu não vos faço mal, a música é linda e vocês dançam muito bem. Deixem-me também.
Mas ninguém apareceu. Então o rapaz foi para casa. Durante toda a noite sonhou com a gruta e com o bailado que vira.
No dia seguinte, bem cedo, resolveu voltar à gruta. Quando lá chegou encontrou um pequeno polvo sentado numa das rochas. Tinha uns cabelos longos, olhos castanhos da cor do mel, uns tentáculos cor-de-rosa e uma linda saia feita de algas.
-Bom dia. – disse Rodrigo. – Como te chamas? Posso ser teu amigo?
Assustado o polvo estremeceu, mas respondeu: -Chamo-me Polvita.
- Polvita! Que nome tão bonito. Então és uma menina! – exclamou Rodrigo.
-Eu chamo-me Rodrigo e sou um rapaz. Vivo aqui perto, mas em terra.
-Já ouvi falar de vocês. – respondeu Polvita ainda um pouco assustada. – Disseram-me que vocês gostam dos polvos para comer.
- Eu não. – respondeu Rodrigo. – Eu só quero ser teu amigo.
E assim deram inicio a uma longa conversa sobre as coisas do mar e da terra. Rodrigo contou as peripécias da escola e Polvita as peripécias das suas aulas de dança.
 Nas semanas seguintes, sempre à mesma hora Polvita e Rodrigo encontravam-se para conversar, brincar, cantar e dançar.
Até que um dia, quando Rodrigo chegou à gruta, não encontrou Polvita.
- Estranho. – pensou. – Ela é sempre tão pontual!
Mas trinta minutos depois Polvita apareceu. Parecia triste.
- Que susto! – Pensei que não vinhas. Aconteceu alguma coisa? Estás triste?
- Estou. – respondeu Polvita. – Hoje acordei com uma dor num dos meus tentáculos e vi que tem um papo. Olha para aqui.
- Que grande papo! Tens que mostrar à tua mãe e ao médico, porque existem papos que se podem transformar em doenças graves e sem cura. – disse Rodrigo.
- Mas eu não quero preocupar a minha mãe, além disso também não gosto de ir ao médico.
E os dois, mais uma vez ficaram ali sentados nas rochas a conversar sobre as coisas da terra e do mar. Foi assim durante várias semanas.
Polvita não quis falar com a sua mãe sobre o seu problema e, como seria de esperar o resultado foi o agravamento da situação.
Um dia, como habitualmente, Rodrigo foi ter à gruta para mais uma conversa com a sua amiga, mas esta não apareceu. O rapaz esperou, esperou, esperou, mas nada. Resolveu então voltar para terra, no entanto seguiu um percurso diferente do habitual.
Parou de repente ao ouvir alguém chorar. Seguiu o som e, encontrou Polvita numa poça das rochas a chorar.
- Que tens Polvita?
- É este papo que me dói muito e está maior. – respondeu Polvita. – Já nem consigo dançar.
- Tens que mostrar à tua mãe. Esse problema tem que ser resolvido. - disse Rodrigo.
Então, Polvita resolveu ir ao encontro de sua mãe. Nesse mesmo dia foram ao médico mostrar o papo. Felizmente não era grave e a situação resolveu-se numa semana.
E assim termina esta história.

Porto Rio


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